OS JOVENS E AS DROGAS


O combustível que anda incendiando as noites do Rio é sinistro. No rastro da onda techno, xaropes, colírios, anestésicos de uso veterinário, bebidas energéticas e calmantes, consumidos puros ou misturados com bebidas alcoólicas, deixaram o gueto das raves para fazer a cabeça de jovens entre 18 e 25 anos nas boates e nas festas pagas mais concorridas da cidade. Embalados por essa química, de difícil controle - os ingredientes são comprados em farmácias ou lojas de conveniência e têm seu uso modificado para provocar o efeito alucinógeno - os freqüentadores da noite garantem a animação nas pistas de danças. Fora delas, os aditivos são sinônimos de confusão. A maioria aumenta a agressividade e serve de estímulo para espíritos briguentos. O efeito a longo prazo é devastador: danos irreversíveis ao cérebro e ao coração, alterações no comportamento, depressão, coma. Mais que isso: ao buscar o "barato" nessas substâncias, o usuário abre uma porta para o uso de drogas pesadas.
- Com as drogas, você tem mais energia para dançar. É perfeito para o ritmo da música eletrônica - conta um programador musical, de 25 anos, usuário do colírio e do anestésico.
- O problema é que essas substâncias criam uma sensação de bem-estar. Para garantir essa sensação, o usuário pode partir para o consumo de drogas pesadas, como cocaína e heroína - explica o psiquiatra José Roberto Keds Nunes de Souza, da clínica de recuperação Solar do Rio e do grupo de prevenção Horizonte.
O anestésico de uso veterinário é estrela nas pistas do mundo todo. Batizado de Special K - já que existem diversos nomes fantasia para o medicamento, à base de ketamina, substância que estimula o sistema nervoso central - ele ameaça o reinado do Ecstasy, ou, E para os íntimos. Segundo o professor de anestesiologia Firmino Marsico Filho, coordenador de pós-graduação da Faculdade de Veterinária da UFF, a ketamina pode provocar convulsões e alterações no sistema cardiovascular.
- Por conta dos efeitos colaterais, o uso medicinal da ketamina diminuiu sensivelmente entre humanos. Quem a usa para se drogar pode até morrer - explica ele.
Nas pistas de dança do Rio, o K divide espaço com o revival do lança-perfume, trazido do Paraguai e cujo frasco custa entre R$ 5 e R$ 10.
- Fui a uma festa de Halloween, na Barra, e fiquei impressionada com a quantidade de frascos de lança-perfume. O pessoal de academia adora - conta a estudante N., de 21 anos, que aprecia o efeito de "cabeça vazia" provocado pelo éter.
Mas o E já encontrou um novo parceiro para não perder público: o Viagra. Nas pistas de dança, a mistura fornece a disposição para dançar a noite inteira. Mas estimula tanto a libido que os usuários acabam sofrendo com as conseqüências.
- Experimentei uma vez para nunca mais. Quando me dei conta, estava numa termas. Fiquei morrendo de medo de ter pego Aids - lembra um publicitário, de 23 anos.
Cenas como essa são cada vez mais comuns na rotina da promoter de uma das boates mais bem freqüentadas do Rio. Há duas semanas, ela viu uma usuária de Ecstasy sair pela porta da boate e se jogar na frente dos carros que passavam na rua.
- A noite do Rio está ficando muito chata por causa dessas coisas. Tenho muitos problemas com lutadores que misturam bebidas energéticas com bebidas alcoólicas ou calmantes com gim. Eles ficam alucinados e, se não arrumarem uma mulher, partem para a briga - comenta ela.
Para arrumar energia, vale tudo. Até fazer coquetel de filme fotográfico com bebida alcoólica. Segundo um arquiteto, de 26 anos, que testou a mistura, são três dias de prazer. Seguidos de um mal estar "que parece interminável".
- Parece que você não é você. Os sentidos ficam mais aguçados - conta ele. - Depois, levei semanas para me recuperar - acrescenta ele, que também já experimentou colírio e xarope.
Sites na internet oferecem drogas para entrega pelo correio.
Caiu na rede, é droga. Quem navega na Internet pode viajar por sites que permitem até comprar Ecstasy, maconha e outros aditivos. Sem sair de casa e com entrega garantida, caso a compra não ultrapasse US$ 50: este é o limite de isenção de impostos para produtos importados, o que significa que pacotes com valor inferior ou igual só são abertos pelos fiscais da Receita Federal se houver uma denúncia de que o conteúdo não é o declarado no documento que acompanha a mercadoria.
Sem controle, a venda de ecstasy e similares floresce na Internet. Para evitar a repressão em seus países de origem, as empresas fornecedoras botam avisos perguntando se o consumidor é maior de 18 anos - ou explicando a legislação referente ao assunto em vários lugares do mundo. Passada essa barreira, o usuário precisa apenas ter um cartão de crédito internacional para abrir as portas do mundo virtual das drogas.
- Você pode importar sementes de maconha, que, dificilmente, alguém vai descobrir. A droga não tem cheiro e, ainda que a polícia ou a receita federal usassem cachorros, não descobririam o conteúdo do pacote - afirma um internauta de 22 anos, que está esperando a entrega de sua primeira encomenda alucinógena.
Um site americano, por exemplo, oferece todo tipo de similar "natural" para as drogas da moda. A propaganda das "plantas espertas" assegura que, embora "menos potentes" do que os originais, elas oferecem "sensações indescritíveis". Os usuários podem até escolher se preferem estimulantes para o cérebro ou para a libido; sementes, cogumelos. Os preços não ultrapassam US$ 10 por vidro com 40 cápsulas.
No mercado, não faltam novidades: um site holandês (com tradução em inglês, espanhol e alemão) oferece um produto exclusivo para testar a qualidade do Ecstasy, do speed e de alguns tipos de anfetaminas. No texto de apresentação, a empresa ressalta que ainda não tem a patente definida, mas lembra que, na maioria dos países, a repressão policial faz com que a droga chegue impura ao usuário.
Na opinião do psicólogo José Henrique Lobato Vianna, diretor-clínico da Cooperativa de Trabalho em Psicologia, as novas tecnologias só fazem ampliar os limites dos jovens:
- É uma idade em que as pessoas querem viver tudo ao mesmo tempo agora. Nos dias de hoje, os limites estão cada vez mais elásticos e os jovens têm a sensação de que podem fazer tudo. Até misturar substâncias químicas de toda maneira.
A produção de drogas aumenta 200% ao ano, segundo dados levantados pela CNBB.
Em matéria publicada no jornal "O SÃO PAULO" a CNBB aponta:
A produção de drogas aumenta 200% ao ano, segundo dados levantados pela CNBB.
A principal causa do alto consumo de entorpecentes nos países ricos, a perda do sentido de vida. Nos países do Terceiro Mundo, as causas são o aumento da miséria, o processo rápido de urbanização e a falta de estabilidade nas famílias.
Pastoralmente. a Igreja vem respondendo a este fenômeno em vários níveis. Em alguns países, onde o problema é mais grave, as Conferências Episcopais têm publicado mensagens oficiais propondo críticas pastorais e linhas de ação. O Pontifício Conselho pastoral no Campo da Saúde criou no ano passado, a pedido do papa, um grupo informal de estudos para reunir dados sobre os trabalhos realizados pela Igreja em todo o mundo. Este grupo organizou em outubro de 1997 um simpósio sobre o tema, reunindo participantes de 45 países.
No Brasil existem as "Comunidades Esperança", que trabalham na recuperação de dependentes químicos, e também iniciativas de paróquias e dioceses que procuram dar apoio aos dependentes. Com o objetivo principal de realizar um trabalho preventivo entre os jovens, o Setor Juventude da CNBB já realizou dois Encontros de Instituições, Fraternidades e Associações que se dedicam a esta causa(em 1977 e 1988).
A CNBB afirma que a igreja deve trabalhar pastoralmente em duas dimensões: a da prevenção e a do trabalho assistencial e de recuperação dos dependentes. "A resposta da Igreja ao fenômeno da tóxico-dependência é uma mensagem de esperança e um serviço que vai além do fato em si, chega ao núcleo central da pessoa humana. Não se limita a eliminar o mal, propõe também a redescoberta do verdadeiro sentido da vida", conclui.

Posted by DJ BURP | às 12:18

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